Saindo da inércia: uma nova era de agentes antimicrobianos se aproxima

março, 2024 Artigo

Redação: Dra. Elizabeth S. Fernandes1,2,3; Téc. Maickel B. Delwing4
Edição: Dra. Nara L. M. Quintão3,4; Dr. João B. Calixto,3,5
1Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, 2Faculdades Pequeno Príncipe, 3INCT-INOVAMED, 4Universidade do Vale do Itajaí, 5Centro de Inovações e Ensaios Pré-clínicos-CIEnP

Milhões de indivíduos em todo o mundo sofrem de infecções anualmente, sendo as bacterianas importantes causadoras de mortalidade. Um levantamento realizado pelo Global Burden of Diseases, Injuries, and Risk Factors Study em 204 países no ano de 2019, indicou que 56,2% dos óbitos estão relacionados à sepse e 13,6% dos 13,7 milhões de óbitos registrados para todas as doenças foram associados com patógenos bacterianos, principalmente Staphylococcus aureus, Escherichia coli, Streptococcus pneumoniae, Klebsiella pneumoniae e Pseudomonas aeruginosa. Antimicrobianos são a principal ferramenta utilizada na clínica para o tratamento de infecções bacterianas, entretanto, o uso não adequado destes medicamentos associado à capacidade adaptativa destes patógenos alavancou uma crise global conhecida como “resistência aos antimicrobianos”, o que significa que antimicrobianos deixaram de ser efetivos no controle de infecções causadas por bactérias. É importante ressaltar que a resistência aos antimicrobianos não é uma “característica” restrita às bactérias, mas também é observada para outros patógenos como fungos, o que tem se tornado uma enorme preocupação principalmente em casos de pacientes com sistema imune deficiente ou suprimido.

Como a resistência a antimicrobianos tem sido contornada? A restrição de prescrições e consequentemente da utilização de antimicrobianos, bem como a conscientização da população sobre os riscos de uso indiscriminado foram medidas de contenção importantes adotadas pelas autoridades de saúde no mundo todo. Ainda, esforços crescentes têm sido empregados pela comunidade científica para que novos antimicrobianos mais eficazes e causadores de menor resistência possam ser desenvolvidos para tratamento de infecções bacterianas e fúngicas.

O que tem sido desenvolvido? Combinações de antimicrobianos em quantidades menores ou “sub-inibitórias” com compostos de origem sintética ou natural têm sido bastante investigados, principalmente aqueles capazes de reduzir ou inibir a adesão do patógeno às mucosas ou pele, mas também a catéters e outros dispositivos invasivos – sendo de extrema relevância para redução de infecções em unidades de terapia intensiva, por exemplo. Ano passado, o Rezzayo foi aprovado pela agência regulatória americana FDA para uso hospitalar endovenoso no tratamento de pacientes com endocardite, osteomielite e meningite causada por Candida sp. Este medicamento tem como prinicípio ativo a rezafungina, uma nova equinocandina – um lipopeptídeo sintético originado de um produto natural derivado de fungos. Recentemente, um grupo de pesquisadores americanos publicou estudo na revista internacional Science, demonstrando a promissora atividade antimicrobiana da cresomicina, um composto sintético desenhado para ligar-se com alta afinidade ao ribossoma de bactérias, como S. aureus e E. coli resistentes aos antimicrobianos, superando assim a ação de metilases ribossomais envolvidas na resistência aos diferentes antibióticos.

Das novas terapias somente o Rezzayo encontra-se disponível para comercialização no exterior (Melinta Therapeutics), com o preço de aproximadamente 2 mil dólares a dose. Apesar de ainda serem poucas as alternativas disponíveis de novos medicamentos para o tratamento de infecções, é importante ressaltar que após várias décadas, inúmeros têm sido os avanços na área de antimicrobianos, permitindo que novos compostos sejam desenhados, combinados, e testados de forma a se alcançar em um futuro breve, terapias mais eficazes com menor potencial de resistência microbiana.

Referências
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